Se o mercado imobiliário não contar com uma alíquota de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) com desconto de 60% na reforma tributária, os preços dos imóveis tanto para aluguel quanto para compra podem aumentar, afirmam especialistas ouvidos pelo E-Investidor. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) enviada ao Senado estipulou um desconto de 40% na alíquota padrão do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) para transações imobiliárias, e de 60% para operações de locação.
Conforme análises técnico-econômicas realizadas por especialistas, haverá um aumento na carga tributária sobre todos os tipos de moradia. “Em geral, na média, o aluguel aumentaria em 5% a 10%. Os corretores e o potencial morador vão ver claramente o impacto no produto que vai sofrer aumento de preço. Como consequência, menos famílias vão acessar o aluguel, porque vai ser necessário ter uma renda maior”, diz o presidente executivo do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação ou Administração de Imóveis Residenciais ou Comerciais (Secovi-SP), Ely Wertheim.
Como consequência direta, as parcelas mensais dos financiamentos imobiliários também tendem a se elevar, tornando o acesso ao crédito no setor mais desafiador, especialmente para famílias de baixa renda e classe média baixa, explicam os especialistas. Adicionalmente, a maior carga tributária pode induzir os bancos a ajustarem suas taxas de juros para compensar o aumento do risco, o que potencializa ainda mais os custos do financiamento para os compradores.
O impacto econômico não se restringe apenas a quem deseja adquirir um imóvel. A expectativa é que a nova tributação diminua a demanda por imóveis, já que muitos potenciais compradores podem não ter capacidade financeira para absorver os custos adicionais, segundo o especialista em finanças Marlon Glaciano.
“Esse cenário pode desacelerar o mercado imobiliário, afetando tanto as vendas quanto a construção de novos imóveis, e gerar um impacto negativo na economia, visto que o setor é um grande gerador de empregos e investimentos”, diz. “A combinação de aumento de custos, redução de demanda e possíveis ajustes nas taxas de juros pode criar um ambiente desafiador para compradores e investidores, comprometendo o crescimento do mercado imobiliário no País”, completa Glaciano.
O Ministério da Fazenda aponta que uma redução mais próxima de 40% deve equilibrar a carga tributária atual de incorporação imobiliária, e que essa porcentagem proposta na reforma tributária está em linha com o impacto atual das mudanças planejadas, o que é importante para entender como isso afetaria os custos e os preços dos imóveis no mercado.
Não é à toa que o corretor imobiliário Guilherme Ferreira tem acelerado seus clientes para fechar negócio o quanto antes. Ele diz que essa abordagem ajuda os dois lados: o profissional e o cliente. “Eu estou ajudando meus clientes a economizarem dinheiro e guardando meu porcentual de retorno na poupança porque não sei como vai ser depois dessa reforma. Até agora estou me dando bem, mas talvez meu trabalho fique bem mais difícil depois”, diz.
A também corretora de imóveis em São Paulo, Mariana Silva, tem uma visão mais pessimista sobre o futuro do mercado. Com a reforma tributária, ela estima perder clientes que, provavelmente, devem se sentir desencorajados pelos altos custos adicionais. “Tenho recebido ligações de clientes preocupados com os aumentos previstos. Alguns já desistiram de comprar e outros estão reconsiderando”, explica. Diante desse cenário, ela avisa que está pensando em mudar de carreira. “Se antes já era difícil, agora periga ficar impossível. A instabilidade e a pressão financeira estão tornando meu trabalho insustentável. Estou explorando outras áreas, talvez algo fora do mercado imobiliário”, revela Silva.
Para quem quer comprar, o cenário também é preocupante. O motorista de aplicativo Carlos Almeida, de 43 anos, sonha em sair do aluguel e ter a casa própria. Almeida diz que tem guardado parte do dinheiro para dar entrada no imóvel, mas está lutando para conseguir um financiamento que caiba no bolso. Endividado, ele precisa pagar as contas e tirar o nome dos órgãos de proteção ao crédito para ter mais chances de conseguir o subsídio.
Ele explica que o problema está justamente aí: só vai conseguir terminar de pagar essa dívida em 2028, quando a reforma tributária já estiver sido aprovada. “Tenho visto os preços dos imóveis subirem e, com os novos impostos, temo que nunca vou conseguir financiar meu apartamento”, desabafa. Carlos já foi aprovado para um financiamento, mas, com os novos custos previstos e as altas taxas de juros, ele não consegue fechar o negócio. “Estou com medo de que, se eu esperar mais, os preços vão ficar ainda mais inacessíveis”, lamenta.
O Ministério da Fazenda discorda do alarde dos especialistas e diz que, atualmente, a compra e venda de imóveis por pessoas físicas que possuem um ou dois imóveis, de maneira ocasional, não é tributada, e afirma que esse modelo continuará da mesma forma no novo modelo tributário. Ou seja, a transação imobiliária realizada por pessoas físicas, que não fazem disso uma atividade principal, permanecerá isenta de tributação.
A reforma tributária também vai trazer mudanças para as construtoras imobiliárias, especialmente no que diz respeito ao Regime Especial de Tributação (RET) e outras modalidades simplificadas de pagamento de impostos federais, projetam tributaristas.
Atualmente, as incorporadoras podem optar pelo RET, conforme estabelecido pela Lei 10.931, de 2004. Esse regime permite que a empresa constitua um Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) específico para cada empreendimento imobiliário. Sob o RET, o imposto é calculado como 4% da receita mensal recebida, compensando o Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Contribuição Social devidos pelo empreendimento.
Alternativamente, as incorporadoras podem optar pelo lucro presumido, em que o Imposto de Renda (IR) é calculado com base em uma margem presumida de lucro.
As normas da Reforma Tributária definem a criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que em conjunto formarão o Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Este imposto substituirá os cinco tributos atualmente aplicados ao consumo: Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto sobre Serviços (ISS).
Diante das mudanças, o tributarista Francisco Lisboa Moreira afirma que os contribuintes, especialmente as incorporadoras imobiliárias que se beneficiam de regimes específicos como o RET, precisam se preparar para uma transição complexa. “Elas [as incorporadoras] vão precisar ou ter uma maior celeridade nos lançamentos ou vão ficar presas com unidades que foram construídas no regime anterior e vão ter que ser vendidas no regime novo. E a gente ainda tem uma tendência grande de uma série de situações cuja regulamentação desse período de transição ainda vai ficar dependente”, analisa.
Para os compradores de unidades imobiliárias, Moreira também acredita que haverá um aumento no valor dos imóveis e uma possível elevação nos custos de financiamento, já que o impacto tributário será incorporado nos preços finais. Isso pode resultar na necessidade de financiamentos mais altos para cobrir esses novos custos tributários.
Entretanto, o Ministério da Fazenda esclarece que na incorporação imobiliária atualmente as empresas pagam a contribuição para o PIS/Pasep, que pode variar de 3,65% no regime cumulativo até 2,08% no regime especial de tributação. No entanto, as incorporadoras não têm direito a recuperar créditos desses impostos. Isso significa que quando compram materiais de construção ou contratam serviços de construção que já incluem tributos, elas não podem deduzir esses valores pagos dos impostos devidos. Consequentemente, o impacto total dessa tributação é significativo, representando aproximadamente 8% do preço final do imóvel, de acordo com estimativas do setor.
No novo modelo proposto, que está em discussão no Senado, o Ministério da Fazenda afirma que as incorporadoras terão a capacidade de recuperar créditos de impostos sobre materiais de construção e serviços contratados. Segundo o órgão, isso representa uma mudança em relação ao sistema atual, onde esses créditos não são recuperáveis.
Além disso, o imposto incidirá sobre o valor da venda do imóvel, deduzindo um redutor de ajuste que corresponde ao custo do terreno onde será construído o empreendimento. Para imóveis populares, há um redutor adicional chamado redutor social, de R$ 100 mil por unidade, o que impacta a tributação para esse segmento. Em contrapartida, a alíquota aplicada será reduzida em 40% em relação à alíquota padrão sobre o custo, segundo o Ministério da Fazenda.
As estimativas sobre o impacto no preço dos imóveis variam entre os setores envolvidos. Enquanto o Ministério da Fazenda projeta uma redução de cerca de 4% nos preços de imóveis populares e um aumento de 3% a 4% nos imóveis de alto padrão, o setor da construção civil estima que esse impacto pode ser um pouco maior, refletindo diferentes suposições sobre o custo do terreno e o valor das obras e serviços relacionados.
Informações retiradas de Murilo Melo ao E-Investidor.
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